ago 252011
 

Mozart e o monge

Mozart, o compositor fecundo e genial, teria trocado toda sua obra pela autoria de uma simples melodia gregoriana.
Andreas Meran von Habsburg

Da capo!” (“voltemos ao início”), diz pacientemente Leopoldo, e os músicos retomam animados os compassos do quarteto de câmara. Nesse instante abre-se a porta e aparece um menino de seus 4 anos, empurrando com decisão uma cadeira para dentro da sala.
— Menino, que faz você? — pergunta Leopoldo, seu pai.
— Vou tocar junto.
Isto dito, senta-se, com um pequeno mas reluzente violino na mão. O pai manda-o retirar-se, dizendo que ele não tivera ainda nenhuma lição de violino.
— Mas, papai, para tocar a partitura do segundo violino não é preciso ter aprendido — insiste o pequerrucho.
Um dos músicos, Schachtner, intercede por ele:
— Ora, Leopoldo, deixe-o tocar a meu lado a partitura do segundo violino. Não nos incomodará.
— Bem, então você pode ficar, mas toque bem baixinho — concorda o pai, não de muito boa vontade…
O pequeno sorri alegremente, e começa a tocar. À medida que avança a música, Schachtner vai tocando cada vez mais baixo, até parar. Para surpresa geral, o menino continua executando a peça sozinho. Leopoldo emociona-se até as lágrimas.
Mas Wolfgang — este era seu nome — deixa todos mais admirados ainda, tocando em seguida a parte difícil do primeiro violino!
Fato espantoso? Sim, claro, mas, afinal de contas, a cena se passa em Salzburgo, Áustria, no século XVIII, onde a música era tão natural quanto o ar.

Monumento_a_Mozart_parque de Burggarten_musicos_talentos_Wolfgang_Amadeus_Mozart

Menino-prodígio, grande gênio musical

E talvez o leitor já tenha descoberto. Trata-se de Wolfgang Amadeus Mozart, der Wunderknabe, o “menino-prodígio”, que em tão tenra idade irrompe com seu incrível talento musical em meio ao mundo barroco de Salzburgo.
Pouco tempo depois, com “sua peruca e sua espadinha apertada à cintura” — como recordava Goethe — ele deslumbraria toda a Europa. Viena, Paris, Londres, Roma, em todas as partes, platéias entusiasmadas o aclamariam.
Inúmeras são as narrações de fatos que atestam seu portentoso gênio musical.
Menino ainda, Woferl — como era apelidado — ditava para seu pai minuetos espirituosos. Assistia a concertos que duravam horas, e de volta ao lar, os reconstituía de cor ao piano.
Compunha suas óperas — a primeira das quais, intitulada Bastião e Bastiana, aos 13 anos — sinfonias, missas, etc., em brevíssimo tempo e, sem revê-las sequer, as entregava a um copista para serem impressas. Escreveu de improviso a abertura de sua ópera Don Giovanni, vinte minutos antes da estréia, enquanto a orquestra treinava.
Dotado de uma inteligência vivíssima, falava e escrevia corretamente o latim, alemão, francês, italiano e inglês. Vestia-se sempre com pulcritude e elegância, costume conservado desde a infância.
Morreu jovem, com 34 anos, mas deixou uma obra monumental. Ainda não se acabou de inventariar suas composições: mais de 50 sinfonias, 20 óperas, 20 missas para orquestra, coro e solistas, inúmeros concertos.
Suas duas mais famosas óperas povoam os cenários dos grandes teatros: A flauta mágica e Dom Giovanni, cujas partituras melodiosas entusiasmam os ouvintes, mas constituem o terror dos regentes e solistas que têm de haver-se com elas….

Toda sua obra pelo “Dies irae”

Entretanto… este grande compositor, como quiçá outro igual não apareceu, numa bela tarde de inverno, entrou numa igreja pouco conhecida.
Contemplando a luz proveniente dos últimos raios de sol filtrados pelos lindos vitrais, deixou-se envolver pelo ambiente do templo sagrado. Mas sua atenção foi atraída, sobretudo, pela melodia de um majestoso órgão, no qual um músico solitário dedilhava o Dies irae, ensaiando esse belíssimo hino para uma Missa de finados. Wolfgang ouviu atentamente a música, e terminados os últimos ecos na penumbra da igreja, voltou-se para o seu acompanhante e lhe confidenciou emocionado: “Eu daria toda a minha obra só para ter composto esta melodia”.
“Dies irae, dies illa”. Quem terá sido o autor dessa sublime música que deixou comovido um compositor de tão grande porte como Mozart?
Ela é atribuída por muitos a Tomas de Celano, biógrafo e discípulo de São Francisco de Assis. Mas o autor pode ter sido também um simples monge anônimo que, no silêncio e no recolhimento de seu mosteiro, se pôs a rezar, a meditar… e a cantar.
Quem inspirou esta melodia foi o Divino Espírito Santo. Ela é fruto da graça de Deus, que Nosso Salvador no alto da Cruz para todos conquistou.
Que dom maravilhoso o gênio musical de Mozart! Mas quão pouca coisa, comparado com uma gota da graça divina! O próprio compositor reconhecia isto implicitamente, com seu comentário.
Bem dizia São Tomás de Aquino, afirmando que uma só gota de graça vale mais do que todo o universo.
“Ave, cheia de graça.” Assim foi saudada pelo Arcanjo a Virgem Maria. Peçamos, pois, a Ela, Mãe da Divina Graça, que nos obtenha, não somente uma gota, mas um oceano de graças.
E assim, melodias muito mais belas que as de Mozart povoarão a terra e os anjos nos acompanharão (como o menino-prodígio ao quarteto do pai Leopoldo) no grande concerto que constituirá a era do triunfo do Imaculado Coração de Maria.

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