set 012011
 

Perseguições aos primeiros cristãos

Ensaio do Pe. José Arnóbio Glavan, EP

Como vimos, as perseguições movidas pelo Império contra os cristãos, tinham como motivo, a insegurança que o cristianismo produzia ao paganismo, e de modo particular, no culto divino prestado aos imperadores, no que viam estes últimos, seu próprio poder político ameaçado. Não podendo, obviamente, declinar a verdadeira causa, encontravam-se na contingência de apresentar ao povo falsas razões para tal procedimento. Assacavam, assim, contra os cristãos acusações várias: ateísmo, por recusarem prestar culto aos deuses; causa de catástrofes públicas por descontentarem as divindades; banquetes licenciosos nos quais se praticava o canibalismo, numa alusão à Sagrada Eucaristia; etc.

Imperador Trajano

Imperador Trajano

Como vimos essas perseguições tiveram inicio com Nero, no ano de 64dC. Desta data até o começo do quarto século seguiram-se —  com crescente intensidade mas também com longos períodos de calmaria e relativa paz — várias grandes investidas.

Podemos dividir tal história em duas épocas: a primeira que vai de Nero (54-69) ao imperador Felipe, o árabe (244-249), e a segunda, de Décio (249-251) a Constantino Magno que, em 313, pelo edito de Milão põe fim, definitivamente, às perseguições.

Tratamos acima das perseguições de Nero e Domiciano,  que se sucederam no trono imperial com o intervalo pacífico de dois imperadores: Vespasiano e Tito o antigo general da tomada de Jerusalém.

A Domiciano sucedeu Trajano  (98-117). Sob seu governo foi elaborado, para uso das autoridades militares do Império, um regulamento com o qual se pretendia dar aparência de legalidade jurídica à opressão aos seguidores de Jesus Cristo. Previa-se que estes não deveriam ser objeto de busca e captura sumárias, nem valeriam, contra eles, denúncias anônimas. Também seriam “benevolamente” agraciados com a liberdade no caso de renegarem a fé. É deste tempo o famoso martírio do grande apologeta Santo Inácio de Antioquia.

Após as sangrentas perseguições de Marco Aurélio (161-180) sob cujo governo deu-se, provavelmente, o martírio de santa Cecília, e de Septimo Severo (193-211), encerra-se a primeira época de perseguições e segue-se quase meio século de relativa tranqüilidade.

A Segunda época abre-se com o imperador Décio e vai até o edito de liberdade concedido por Constantino I.

Décio (249-251) preocupado com o paulatino enfraquecimento do Império, e do culto pagão oficial, resolveu reforçá-lo, decretando a obrigatoriedade para todos os cidadãos de manifestar por um ato público, sua submissão aos deuses. Para testemunho disso, deveriam oferecer publicamente um sacrifício às divindades, mediante o qual receberiam um libellus (certificado) do cumprimento da lei. As penas de prisão, confisco de bens, escravidão e mesmo a de morte, eram aplicáveis aos refratários. É este o fato novo, que justifica a classificação de uma nova etapa na história das perseguições e que de certo modo altera, fundamentalmente, os procedimentos legais iniciados por Trajano. De fato, para efeito do cumprimento dessa lei, os cristãos podiam já ser procurados e eram estes, naturalmente, os mais visados. Data deste período o glorioso martírio de Santa Águeda.

O resultado foi que a perseguição se intensificou imensamente. Cristãos houve, que diante de ameaças de atrozes sofrimentos, vacilaram acabando por ceder às exigências imperiais; são os lapsi (caídos). Numerosos dentre eles, entretanto, se arrependiam e voltavam implorando o perdão, e não poucos lavavam suas faltas no sangue, pelo martírio que então corajosamente enfrentavam. A Igreja se enriqueceu,  assim, com uma multidão incontável de gloriosos mártires, de ambos os sexos e todas as idades, que povoaram o firmamento da História, e fecundaram, como nunca, a Santa Igreja de Deus. Tal fato provocou o dito célebre de Tertuliano de que esse sangue é semens Christianorum [semente de cristãos](1). Sucederam-se os imperadores Treboniano Galo (251-253), sob cujo governo houve relativa paz, e Valeriano (253-260), que recrudesceu as perseguições. Entretanto, quem se excedeu a todos na violência foi Diocleciano (284-305), que promoveu a última e a mais sangrenta das perseguições.

Imperium_Mapa_Romao_Imperio_Roma_deroma_mapa_Vaticano_MuseusComeçou por reorganizar o império, dividindo-o em duas unidades políticas, instituindo assim  a diarquia (dois governos): a do Oriente, cujo governo reservou a si, e a do Ocidente confiada a Maximiano, soldado rude mas extraordinariamente enérgico. Completou, posteriormente tal reforma, constituindo mais duas unidades e nomeando mais dois imperadores para as governarem, gozando estes, entretanto, de honras inferiores. O título de César Augusto era atribuído aos dois primeiros enquanto aos outros se dava, simplesmente, o de César. Estava instituída assim a chamada   tetrarquia (quatro governos), com dois Augustos e dois Césares, sendo que aos Augustos deveriam suceder, como herdeiros, os Césares, e novos Césares serem nomeados.

Quando Diocleciano instituiu a tetrarquia, havia já trinta anos que os cristãos estavam em paz.  Por toda parte eles se multiplicavam e mesmo entre os funcionários do Império, magistrados, soldados, numerosos eram os cristãos. Dizia-se que as próprias esposa e filha, de Diocleciano, Prisca e Valéria, acalentavam simpatia para com  a religião de Cristo, e até mesmo — certamente exagero — que o César Constâncio Cloro, estava prestes a se converter.

Certo é que por toda parte o paganismo deixava entrever sua ruína próxima. O famoso dito de Tertuliano hipoteticamente dirigido ao Imperador, em começos do III século, é sintomático neste sentido: “Não somos senão de ontem, mas enchemos vossas cidades; vossas casas vossas praças; o Exército e o Conselho Real; os campos e as tribos, vossos palácios o Senado e o Fórum. Se nós nos retirarmos, sereis esmagados por vossa imensa solidão.

Ao que parece foi o César Galério, inimigo do partido de Constâncio Cloro simpático ao Cristianismo, que alertou Diocleciano para esta situação e o induziu a mover a mais atroz de todas as perseguições, desencadeada no ano de 295, e por cerca de dez anos fez correr o sangue de milhares de mártires entre eles Santa Inês, São Sebastião, Santa Catarina de Alexandria, São Brás, Santos Cosme e Damião, entre muitíssimos outros.

Bibliografia

(1) Plures efficimur quoties metimur a vobis, semens est sanguis christianorum (quanto mais somos dizimados por vós tanto mais crescemos, o sangue dos cristãos é semente), in Tertuliano, Apologeticum, 50

ago 102011
 

Os Padres Latinos

Autor: Ronaldo Baccelli

Nos primórdios da Igreja, o grego era a sua língua oficial. Quase todo o Novo Testamento, bem como os escritos dos Padres Apostólicos e da maior parte dos Apologistas, foram feitos em grego. Mas aos poucos, o latim foi tomando a dianteira, até por fim tornar-se a língua oficial.

Minúcio Félix

É de Minúcio Félix, um advogado romano, o diálogo apologético em latim denominado Otávio (escrito por volta de 197). Essa obra foi a única escrita em latim no tempo das perseguições.

O genial Tertuliano

Figura de relevo, no mundo latino, é Quintus Septimius Florens Tertullianus, nascido em Cartago por volta do ano 160, filho de um centurião, pagão com excelente formação intelectual, dominando o grego e possuidor de grandes conhecimentos jurídicos e de retórica. Depois de exercer a jurisprudência em Roma, retornou para sua cidade de origem por volta de 195, já como cristão. Mas em torno do ano 207 rompeu com a Igreja e aderiu ao montanismo. Morreu provavelmente depois ano 220.

Por do sol_mar_poente_aurora_beleza

Conhecendo na perfeição o latim, Tertuliano foi o primeiro a usar o termo Trinitas para designar a Trindade. Expôs também a tese de que o Pai e o Filho eram da mesma substância, tendo-se assim antecipado de um século ao Símbolo de Nicéia.

Suas principais obras foram: Ad nationes, o Apologeticum (aos governadores das províncias do Império – uma apologia que defende os cristãos de acusações políticas tais como o crime de lesa-majestade e a negação dos deuses imperiais; sua argumentação é do ponto de vista jurídico), Adversus Iudaeos, De praescriptione haereticorum, Adversus Marcionem (contra a gnose de Marcião), Adversus Valentinianos (contra a gnose de Valentino), Scorpiace, De carne Christi (contra o docetismo dos gnósticos), Adversus Praxean (trata-se da exposição mais clara, antes de Nicéia, acerca da doutrina da Trindade, contra o patripassiano Práxeas), De baptismo, De anima (obra anti-gnóstica), Ad martyres, De paenitentia, Ad uxorum

Tertuliano fala das duas naturezas e da única pessoa de Jesus Cristo. Ensina que o primado e o poder das chaves foram dados a S. Pedro (fala da morte de S. Pedro e S. Paulo em Roma). Enquanto era católico, ensinava que a Igreja tinha poder de perdoar os pecados, mas uma só vez. Fazendo eco à Didaqué, para ele a Missa é o cumprimento da profecia de Malaquias (Ml 1, 10s), sacrifício verdadeiro oferecido a Deus, e a Eucaristia é o Corpo e o Sangue de Cristo. Também admite um estado de purificação póstumo, no qual todos, menos os mártires, permanecem até o dia do Juízo. As orações dos vivos, segundo ele, podem confortar os que se encontram no Hades. Era milenarista.

Contra os hereges, Tertuliano ensina que apenas a Igreja possui a fé. A ela cabe a reta interpretação das Escrituras, à luz da Tradição. A doutrina conservada nas Igrejas apostólicas estabelece as verdades que devem ser cridas por todos os fiéis. É inútil, segundo ele, discutir com os hereges servindo-se das Escrituras pois eles a distorcem.

Do período montanista temos alguns escritos de caráter ascético, como o De exhortatione castitatis, em que exorta um amigo viúvo a não contrair novas núpcias, De corona (em que condena o exercício das funções militares por cristãos e refere de passagem o costume de se fazer o sinal da cruz), De pudicitia (onde, contrariamente ao que defendia quando católico, nega à Igreja o poder de perdoar pecados).

Sua atitude diante da filosofia pagã é essencialmente negativa. Acredita na possibilidade de uma demonstração racional da existência de Deus e da imortalidade da alma e afirma que a especulação filosófica só é útil enquanto concorda com o Evangelho.

Ao contrário do consenso geral da Tradição cristã, Tertuliano negava a virgindade perpétua de Maria.

São Cipriano de Cartago

Thascius Cecilius Cyprianus nasceu em Cartago (entre 200-210) de uma família rica e pagã. Recebeu o batismo em 246, sendo sagrado, dois ou três anos depois, bispo de sua cidade.

A perseguição de Décio (250) interrompeu suas atividades pastorais, uma vez que foi forçado a se esconder.

Em sua época, muitos apóstatas, os assim chamados lapsi começaram a ser facilmente readmitidos na Igreja, o que deu origem a um cisma. Em 251, S. Cipriano voltou para Cartago e num sínodo excomungou os chefes da dissidência laxista, determinando que os apóstatas passassem por severas penitências antes de reingressarem na comunidade.

A peste que atingiu o Império em 252 provocou novos sofrimentos e perseguições na África.

Nos últimos anos de sua vida, ocupou-se com a questão do batismo dos hereges. Cipriano considerava inválido o batismo ministrado por hereges, e mesmo depois da reprovação do papa Estevão, manteve seu ponto de vista.

Foi decapitado no dia 14 de setembro de 258, em Cartago, reinando Valeriano. O martírio de sangue o redimiu certamente de seu erro.

S. Cipriano compôs as seguintes obras: De ecclesia unitate (c. 251, na qual apoia o papa Cornélio contra Novaciano), De lapsis, De habitu virginum, De mortalitate.

Apregoava a doutrina de que a unidade da Igreja é garantida pela união de todos com o bispo. Ficaram famosas diversas máximas suas:

“Salus extra ecclesiam non est” ou seja, “não há salvação fora da Igreja”;

v  “Quem abandona a sede de Pedro, sobre a qual está fundada a Igreja, como pode afirmar que está na verdadeira Igreja?”;

v  “Não pode ter Deus por Pai quem não tem a Igreja por mãe”.

São Pedro_Saint_Peter_BasilicaSPietro_tramonto_Vatican_City

Ensinava que uma tradição só é válida quando se apóia na “tradição evangélica e apostólica”, ou seja, aquela tradição que provém da “autoridade do Senhor e do Evangelho, das prescrições e das epístolas dos apóstolos”. Afirmava que os recém-nascidos deviam receber o quanto antes o batismo e a eucaristia, e que a missa é a repetição do sacrifício de Jesus na Cruz. Ensinava ainda que a penitência consiste na confissão pública dos pecados e na expiação, e que todos os justos defuntos (inclusive os não-mártires) recebem sua recompensa imediatamente após a morte; segundo ele, o estado intermediário no Hades se aplica somente aos penitentes.

Comodiano, Vitorino de Petau, Arnóbio de Sica e Lactâncio são outros grandes representantes da literatura cristã em latim no século III e no início do século IV.

Os Padres Latinos

Nos primórdios da Igreja, o grego era a sua língua oficial. Quase todo o Novo Testamento, bem como os escritos dos Padres Apostólicos e da maior parte dos Apologistas, foram feitos em grego. Mas aos poucos, o latim foi tomando a dianteira, até por fim tornar-se a língua oficial.

Minúcio Félix

É de Minúcio Félix, um advogado romano, o diálogo apologético em latim denominado Otávio (escrito por volta de 197). Essa obra foi a única escrita em latim no tempo das perseguições.

O genial Tertuliano

Figura de relevo, no mundo latino, é Quintus Septimius Florens Tertullianus, nascido em Cartago por volta do ano 160, filho de um centurião, pagão com excelente formação intelectual, dominando o grego e possuidor de grandes conhecimentos jurídicos e de retórica. Depois de exercer a jurisprudência em Roma, retornou para sua cidade de origem por volta de 195, já como cristão. Mas em torno do ano 207 rompeu com a Igreja e aderiu ao montanismo. Morreu provavelmente depois ano 220.

Conhecendo na perfeição o latim, Tertuliano foi o primeiro a usar o termo Trinitas para designar a Trindade. Expôs também a tese de que o Pai e o Filho eram da mesma substância, tendo-se assim antecipado de um século ao Símbolo de Nicéia.

Suas principais obras foram: Ad nationes, o Apologeticum (aos governadores das províncias do Império – uma apologia que defende os cristãos de acusações políticas tais como o crime de lesa-majestade e a negação dos deuses imperiais; sua argumentação é do ponto de vista jurídico), Adversus Iudaeos, De praescriptione haereticorum, Adversus Marcionem (contra a gnose de Marcião), Adversus Valentinianos (contra a gnose de Valentino), Scorpiace, De carne Christi (contra o docetismo dos gnósticos), Adversus Praxean (trata-se da exposição mais clara, antes de Nicéia, acerca da doutrina da Trindade, contra o patripassiano Práxeas), De baptismo, De anima (obra anti-gnóstica), Ad martyres, De paenitentia, Ad uxorum

Tertuliano fala das duas naturezas e da única pessoa de Jesus Cristo. Ensina que o primado e o poder das chaves foram dados a S. Pedro (fala da morte de S. Pedro e S. Paulo em Roma). Enquanto era católico, ensinava que a Igreja tinha poder de perdoar os pecados, mas uma só vez. Fazendo eco à Didaqué, para ele a Missa é o cumprimento da profecia de Malaquias (Ml 1, 10s), sacrifício verdadeiro oferecido a Deus, e a Eucaristia é o Corpo e o Sangue de Cristo. Também admite um estado de purificação póstumo, no qual todos, menos os mártires, permanecem até o dia do Juízo. As orações dos vivos, segundo ele, podem confortar os que se encontram no Hades. Era milenarista.

Contra os hereges, Tertuliano ensina que apenas a Igreja possui a fé. A ela cabe a reta interpretação das Escrituras, à luz da Tradição. A doutrina conservada nas Igrejas apostólicas estabelece as verdades que devem ser cridas por todos os fiéis. É inútil, segundo ele, discutir com os hereges servindo-se das Escrituras pois eles a distorcem.

Do período montanista temos alguns escritos de caráter ascético, como o De exhortatione castitatis, em que exorta um amigo viúvo a não contrair novas núpcias, De corona (em que condena o exercício das funções militares por cristãos e refere de passagem o costume de se fazer o sinal da cruz), De pudicitia (onde, contrariamente ao que defendia quando católico, nega à Igreja o poder de perdoar pecados).

Sua atitude diante da filosofia pagã é essencialmente negativa. Acredita na possibilidade de uma demonstração racional da existência de Deus e da imortalidade da alma e afirma que a especulação filosófica só é útil enquanto concorda com o Evangelho.

Ao contrário do consenso geral da Tradição cristã, Tertuliano negava a virgindade perpétua de Maria.

São Cipriano de Cartago

Thascius Cecilius Cyprianus nasceu em Cartago (entre 200-210) de uma família rica e pagã. Recebeu o batismo em 246, sendo sagrado, dois ou três anos depois, bispo de sua cidade.

A perseguição de Décio (250) interrompeu suas atividades pastorais, uma vez que foi forçado a se esconder.

Em sua época, muitos apóstatas, os assim chamados lapsi começaram a ser facilmente readmitidos na Igreja, o que deu origem a um cisma. Em 251, S. Cipriano voltou para Cartago e num sínodo excomungou os chefes da dissidência laxista, determinando que os apóstatas passassem por severas penitências antes de reingressarem na comunidade.

A peste que atingiu o Império em 252 provocou novos sofrimentos e perseguições na África.

Nos últimos anos de sua vida, ocupou-se com a questão do batismo dos hereges. Cipriano considerava inválido o batismo ministrado por hereges, e mesmo depois da reprovação do papa Estevão, manteve seu ponto de vista.

Foi decapitado no dia 14 de setembro de 258, em Cartago, reinando Valeriano. O martírio de sangue o redimiu certamente de seu erro.

S. Cipriano compôs as seguintes obras: De ecclesia unitate (c. 251, na qual apoia o papa Cornélio contra Novaciano), De lapsis, De habitu virginum, De mortalitate.

Apregoava a doutrina de que a unidade da Igreja é garantida pela união de todos com o bispo. Ficaram famosas diversas máximas suas:

v “Salus extra ecclesiam non est” ou seja, “não há salvação fora da Igreja”;

v “Quem abandona a sede de Pedro, sobre a qual está fundada a Igreja, como pode afirmar que está na verdadeira Igreja?”;

v “Não pode ter Deus por Pai quem não tem a Igreja por mãe”.

Ensinava que uma tradição só é válida quando se apóia na “tradição evangélica e apostólica”, ou seja, aquela tradição que provém da “autoridade do Senhor e do Evangelho, das prescrições e das epístolas dos apóstolos”. Afirmava que os recém-nascidos deviam receber o quanto antes o batismo e a eucaristia, e que a missa é a repetição do sacrifício de Jesus na Cruz. Ensinava ainda que a pen

Os Padres Latinos

Nos primórdios da Igreja, o grego era a sua língua oficial. Quase todo o Novo Testamento, bem como os escritos dos Padres Apostólicos e da maior parte dos Apologistas, foram feitos em grego. Mas aos poucos, o latim foi tomando a dianteira, até por fim tornar-se a língua oficial.

Minúcio Félix

É de Minúcio Félix, um advogado romano, o diálogo apologético em latim denominado Otávio (escrito por volta de 197). Essa obra foi a única escrita em latim no tempo das perseguições.

O genial Tertuliano

Figura de relevo, no mundo latino, é Quintus Septimius Florens Tertullianus, nascido em Cartago por volta do ano 160, filho de um centurião, pagão com excelente formação intelectual, dominando o grego e possuidor de grandes conhecimentos jurídicos e de retórica. Depois de exercer a jurisprudência em Roma, retornou para sua cidade de origem por volta de 195, já como cristão. Mas em torno do ano 207 rompeu com a Igreja e aderiu ao montanismo. Morreu provavelmente depois ano 220.

Conhecendo na perfeição o latim, Tertuliano foi o primeiro a usar o termo Trinitas para designar a Trindade. Expôs também a tese de que o Pai e o Filho eram da mesma substância, tendo-se assim antecipado de um século ao Símbolo de Nicéia.

Suas principais obras foram: Ad nationes, o Apologeticum (aos governadores das províncias do Império – uma apologia que defende os cristãos de acusações políticas tais como o crime de lesa-majestade e a negação dos deuses imperiais; sua argumentação é do ponto de vista jurídico), Adversus Iudaeos, De praescriptione haereticorum, Adversus Marcionem (contra a gnose de Marcião), Adversus Valentinianos (contra a gnose de Valentino), Scorpiace, De carne Christi (contra o docetismo dos gnósticos), Adversus Praxean (trata-se da exposição mais clara, antes de Nicéia, acerca da doutrina da Trindade, contra o patripassiano Práxeas), De baptismo, De anima (obra anti-gnóstica), Ad martyres, De paenitentia, Ad uxorum

Tertuliano fala das duas naturezas e da única pessoa de Jesus Cristo. Ensina que o primado e o poder das chaves foram dados a S. Pedro (fala da morte de S. Pedro e S. Paulo em Roma). Enquanto era católico, ensinava que a Igreja tinha poder de perdoar os pecados, mas uma só vez. Fazendo eco à Didaqué, para ele a Missa é o cumprimento da profecia de Malaquias (Ml 1, 10s), sacrifício verdadeiro oferecido a Deus, e a Eucaristia é o Corpo e o Sangue de Cristo. Também admite um estado de purificação póstumo, no qual todos, menos os mártires, permanecem até o dia do Juízo. As orações dos vivos, segundo ele, podem confortar os que se encontram no Hades. Era milenarista.

Contra os hereges, Tertuliano ensina que apenas a Igreja possui a fé. A ela cabe a reta interpretação das Escrituras, à luz da Tradição. A doutrina conservada nas Igrejas apostólicas estabelece as verdades que devem ser cridas por todos os fiéis. É inútil, segundo ele, discutir com os hereges servindo-se das Escrituras pois eles a distorcem.

Do período montanista temos alguns escritos de caráter ascético, como o De exhortatione castitatis, em que exorta um amigo viúvo a não contrair novas núpcias, De corona (em que condena o exercício das funções militares por cristãos e refere de passagem o costume de se fazer o sinal da cruz), De pudicitia (onde, contrariamente ao que defendia quando católico, nega à Igreja o poder de perdoar pecados).

Sua atitude diante da filosofia pagã é essencialmente negativa. Acredita na possibilidade de uma demonstração racional da existência de Deus e da imortalidade da alma e afirma que a especulação filosófica só é útil enquanto concorda com o Evangelho.

Ao contrário do consenso geral da Tradição cristã, Tertuliano negava a virgindade perpétua de Maria.

São Cipriano de Cartago

Thascius Cecilius Cyprianus nasceu em Cartago (entre 200-210) de uma família rica e pagã. Recebeu o batismo em 246, sendo sagrado, dois ou três anos depois, bispo de sua cidade.

A perseguição de Décio (250) interrompeu suas atividades pastorais, uma vez que foi forçado a se esconder.

Em sua época, muitos apóstatas, os assim chamados lapsi começaram a ser facilmente readmitidos na Igreja, o que deu origem a um cisma. Em 251, S. Cipriano voltou para Cartago e num sínodo excomungou os chefes da dissidência laxista, determinando que os apóstatas passassem por severas penitências antes de reingressarem na comunidade.

A peste que atingiu o Império em 252 provocou novos sofrimentos e perseguições na África.

Nos últimos anos de sua vida, ocupou-se com a questão do batismo dos hereges. Cipriano considerava inválido o batismo ministrado por hereges, e mesmo depois da reprovação do papa Estevão, manteve seu ponto de vista.

Foi decapitado no dia 14 de setembro de 258, em Cartago, reinando Valeriano. O martírio de sangue o redimiu certamente de seu erro.

S. Cipriano compôs as seguintes obras: De ecclesia unitate (c. 251, na qual apoia o papa Cornélio contra Novaciano), De lapsis, De habitu virginum, De mortalitate.

Apregoava a doutrina de que a unidade da Igreja é garantida pela união de todos com o bispo. Ficaram famosas diversas máximas suas:

“Salus extra ecclesiam non est” ou seja, “não há salvação fora da Igreja”;

v  “Quem abandona a sede de Pedro, sobre a qual está fundada a Igreja, como pode afirmar que está na verdadeira Igreja?”;

v  “Não pode ter Deus por Pai quem não tem a Igreja por mãe”.

Ensinava que uma tradição só é válida quando se apóia na “tradição evangélica e apostólica”, ou seja, aquela tradição que provém da “autoridade do Senhor e do Evangelho, das prescrições e das epístolas dos apóstolos”. Afirmava que os recém-nascidos deviam receber o quanto antes o batismo e a eucaristia, e que a missa é a repetição do sacrifício de Jesus na Cruz. Ensinava ainda que a penitência consiste na confissão pública dos pecados e na expiação, e que todos os justos defuntos (inclusive os não-mártires) recebem sua recompensa imediatamente após a morte; segundo ele, o estado intermediário no Hades se aplica somente aos penitentes.

Comodiano, Vitorino de Petau, Arnóbio de Sica e Lactâncio são outros grandes representantes da literatura cristã em latim no século III e no início do século IV.

itência consiste na confissão pública dos pecados e na expiação, e que todos os justos defuntos (inclusive os não-mártires) recebem sua recompensa imediatamente após a morte; segundo ele, o estado intermediário no Hades se aplica somente aos penitentes.

Comodiano, Vitorino de Petau, Arnóbio de Sica e Lactâncio são outros grandes representantes da literatura cristã em latim no século III e no início do século IV.