set 072011
 

Luz no horizonte

Ensaio do Pe. José Arnóbio Glavan, EP

Em fins de 303, no auge da perseguição e quando Diocleciano se preparava para comemorar sua vicennalia (20 anos de reinado), o Império é abalado por uma surpreendente e misteriosa notícia: os dois imperadores, Diocleciano e Maximiano acabavam de abdicar, simultâneamente em Nicomédia e Milão, e se retirar para  províncias distantes. Haviam, entretanto, promovido à condição de Augustos, os dois Césares Galério e Constâncio Cloro, este último, simpático ao Cristianismo e pai do futuro imperador Constantino. Também dois novos Césares surgiram: Flávio Severo no Ocidente e Maximino Daia no Oriente, este último inicialmente partidário de uma política de paz com os cristãos. Admiráveis desígnios de Deus começam a se fazer notar nas tramas do acontecer histórico!

005 - diluvio_luz_ocaso_pordosol_raio_trovao_skyline_horizonte_beleza_ceu_nascerdosol_aurora

Os acontecimentos políticos levaram, mais uma vez, ao recrudescimento das perseguições, mas já não com unânime opinião entre os meios oficiais. Uma poderosa e crescente corrente de opinião, defendia uma política de paz.

Por nove anos o Império experimentou um período de caos, com sucessivas lutas pelo poder. Caos este que se prolongou, de certo modo, pelo reino de Constantino a dentro. Constantino a quem este emaranhado de acontecimentos acabou por projetar como figura exponencial, vinha abrir uma nova era para a Religião de Jesus Cristo. Galério, então Augusto no Oriente, tomado por pavorosa doença e vendo a morte se aproximar, procurou aliviar sua consciência decretando o fim das perseguições, no ano de 311, medida que contou com a aprovação de Constantino e do César Licínio. Tal fato estava a anunciar  monumental virada nos acontecimentos e na história da Igreja e da humanidade.

Impossível é determinar com exatidão o número de mártires desses dois séculos e meio de perseguições, e as opiniões oscilam entre cem mil a cinco milhões, por onde se vê a insuperável dificuldade de precisar uma cifra, ainda que aproximada. A realidade é que neste tempo, a Igreja Celeste acolheu em seu seio uma gloriosa coorte de santos, que completaram na carne o que falta às tribulações de Cristo (cf. Cl 1,24)

Constantino

Jovem, alto e forte, pelo seu porte e caráter Constantino impunha respeito. Sua mãe, cristã fervorosa e hoje venerada por toda a Igreja como Santa Helena, exercia sobre ele poderosa influência. Após a morte de seu pai, Constâncio Cloro, ascende ele à condição de Augusto, e seu valor militar, provado em sucessivas conquistas, lhe valem a admiração e dedicação das legiões romanas. Despontava assim como poder único e soberano o que, entretanto, não lhe poupou adversários. Maxêncio, Augusto de Roma, também pretendeu para si o poder supremo, e declarou-se único Imperador. Constantino veio lhe dar batalha às portas de Roma.

Imperador Constantino e Santa Helena em Kaysersberg, Alsacia, França

Imperador Constantino e Santa Helena em Kaysersberg, Alsacia, França

Corria o ano de 312 quando, a 27 de outubro, Constantino chegava a cidade dos Césares. No dia seguinte, pela aurora, o exército de Maxêncio, muito mais numeroso do que o de Constantino, vinha ao encontro deste, atravessando o rio Tibre pela Ponte Mílvia. Logo no primeiro embate, as forças de Constantino impuseram surpreendente derrota aos ocidentais que estes, recuando desnorteados, se afogavam no rio Tibre. Após esta batalha, Constantino que era pagão e adorador do Sol Invictus, converte-se e faz-se cristão. O que se teria passado? é esta uma questão que desafia a argúcia dos historiadores. Importantes documentos e monumentos da época, atestam que Constantino “invocou o Deus dos cristãos e lhe ficou devendo a vitória”.

É entretanto através do historiador Eusébio de Cesaréia, que se conhece os pormenores: Constantino, no momento de entrar em luta contra Maxêncio, apelou para o Deus dos cristãos e então viu, em pleno dia , uma cruz luminosa no céu com estas palavras: “In hoc signo vinces” (“Com este sinal vencerás”). Na noite seguinte apareceu-lhe Cristo convidando-o a fazer uma insígnia com o sinal da Cruz. A partir deste momento, tal insígnia nunca mais deixará de acompanhar os exércitos de Constantino, e ficou conhecida com o nome de Labarum (bandeira) e trazia uma  justaposição das letras gregas X e P, que correspondem as latinas CH e R, iniciais da palavra Christus. Tal símbolo ainda hoje é muito usado em sacrários, vestes litúrgicas e outros objetos sacros.

No ano seguinte era promulgado o famoso Edito de Milão, pelo qual Constantino punha fim, definitivamente, às perseguições, e declarava a liberdade da Igreja em todo o Império. Doou ao Papa sua própria residência, o Palácio Lateranense junto ao qual foi construída a primeira igreja cristã, a Basílica do Santíssimo Salvador ou de São João de Latrão como hoje é conhecida, e que vem a ser a igreja mãe de todas as igrejas de Roma e do mundo (1). Foi porém um sucessor de Constantino, Teodósio I, dito o Grande, que levou às últimas conseqüências os seus atos, declarando no ano  390, o Cristianismo a  religião oficial do Império, e proscrevendo, em toda a extensão de suas terras, o culto pagão. As igrejas e catedrais se substituíram aos templos dos ídolos, e o culto dos falsos deuses cedeu lugar a adoração do verdadeiro Deus. A Igreja se encheu de monumentos, e a fé encontrava poderoso estímulo na realidade humana, quando os mais altos potentados da terra eram vistos, humildemente e de joelhos, a prestar homenagem, devoção e serviço, ao Rei dos reis e Senhor dos senhores.

Tal situação trouxe, indubitavelmente, muitos benefícios para a Igreja. Não entretanto, sem lhe acarretar graves inconvenientes. Sobre isso trataremos mais adiante.

(1) Nesta basílica se veneram as tábuas da manjedoura em que nasceu o Menino Jesus, e em suas dependências foram realizados cinco concílios ecumênicos

Tópicos relacionados

Curso Básico de História da Igreja

Perseguição e expansão no Império Romano

A Igreja deixa o ninho

O cristianismo perseguido (64-313 d.C.)

ago 102011
 

Os Padres Latinos

Autor: Ronaldo Baccelli

Nos primórdios da Igreja, o grego era a sua língua oficial. Quase todo o Novo Testamento, bem como os escritos dos Padres Apostólicos e da maior parte dos Apologistas, foram feitos em grego. Mas aos poucos, o latim foi tomando a dianteira, até por fim tornar-se a língua oficial.

Minúcio Félix

É de Minúcio Félix, um advogado romano, o diálogo apologético em latim denominado Otávio (escrito por volta de 197). Essa obra foi a única escrita em latim no tempo das perseguições.

O genial Tertuliano

Figura de relevo, no mundo latino, é Quintus Septimius Florens Tertullianus, nascido em Cartago por volta do ano 160, filho de um centurião, pagão com excelente formação intelectual, dominando o grego e possuidor de grandes conhecimentos jurídicos e de retórica. Depois de exercer a jurisprudência em Roma, retornou para sua cidade de origem por volta de 195, já como cristão. Mas em torno do ano 207 rompeu com a Igreja e aderiu ao montanismo. Morreu provavelmente depois ano 220.

Por do sol_mar_poente_aurora_beleza

Conhecendo na perfeição o latim, Tertuliano foi o primeiro a usar o termo Trinitas para designar a Trindade. Expôs também a tese de que o Pai e o Filho eram da mesma substância, tendo-se assim antecipado de um século ao Símbolo de Nicéia.

Suas principais obras foram: Ad nationes, o Apologeticum (aos governadores das províncias do Império – uma apologia que defende os cristãos de acusações políticas tais como o crime de lesa-majestade e a negação dos deuses imperiais; sua argumentação é do ponto de vista jurídico), Adversus Iudaeos, De praescriptione haereticorum, Adversus Marcionem (contra a gnose de Marcião), Adversus Valentinianos (contra a gnose de Valentino), Scorpiace, De carne Christi (contra o docetismo dos gnósticos), Adversus Praxean (trata-se da exposição mais clara, antes de Nicéia, acerca da doutrina da Trindade, contra o patripassiano Práxeas), De baptismo, De anima (obra anti-gnóstica), Ad martyres, De paenitentia, Ad uxorum

Tertuliano fala das duas naturezas e da única pessoa de Jesus Cristo. Ensina que o primado e o poder das chaves foram dados a S. Pedro (fala da morte de S. Pedro e S. Paulo em Roma). Enquanto era católico, ensinava que a Igreja tinha poder de perdoar os pecados, mas uma só vez. Fazendo eco à Didaqué, para ele a Missa é o cumprimento da profecia de Malaquias (Ml 1, 10s), sacrifício verdadeiro oferecido a Deus, e a Eucaristia é o Corpo e o Sangue de Cristo. Também admite um estado de purificação póstumo, no qual todos, menos os mártires, permanecem até o dia do Juízo. As orações dos vivos, segundo ele, podem confortar os que se encontram no Hades. Era milenarista.

Contra os hereges, Tertuliano ensina que apenas a Igreja possui a fé. A ela cabe a reta interpretação das Escrituras, à luz da Tradição. A doutrina conservada nas Igrejas apostólicas estabelece as verdades que devem ser cridas por todos os fiéis. É inútil, segundo ele, discutir com os hereges servindo-se das Escrituras pois eles a distorcem.

Do período montanista temos alguns escritos de caráter ascético, como o De exhortatione castitatis, em que exorta um amigo viúvo a não contrair novas núpcias, De corona (em que condena o exercício das funções militares por cristãos e refere de passagem o costume de se fazer o sinal da cruz), De pudicitia (onde, contrariamente ao que defendia quando católico, nega à Igreja o poder de perdoar pecados).

Sua atitude diante da filosofia pagã é essencialmente negativa. Acredita na possibilidade de uma demonstração racional da existência de Deus e da imortalidade da alma e afirma que a especulação filosófica só é útil enquanto concorda com o Evangelho.

Ao contrário do consenso geral da Tradição cristã, Tertuliano negava a virgindade perpétua de Maria.

São Cipriano de Cartago

Thascius Cecilius Cyprianus nasceu em Cartago (entre 200-210) de uma família rica e pagã. Recebeu o batismo em 246, sendo sagrado, dois ou três anos depois, bispo de sua cidade.

A perseguição de Décio (250) interrompeu suas atividades pastorais, uma vez que foi forçado a se esconder.

Em sua época, muitos apóstatas, os assim chamados lapsi começaram a ser facilmente readmitidos na Igreja, o que deu origem a um cisma. Em 251, S. Cipriano voltou para Cartago e num sínodo excomungou os chefes da dissidência laxista, determinando que os apóstatas passassem por severas penitências antes de reingressarem na comunidade.

A peste que atingiu o Império em 252 provocou novos sofrimentos e perseguições na África.

Nos últimos anos de sua vida, ocupou-se com a questão do batismo dos hereges. Cipriano considerava inválido o batismo ministrado por hereges, e mesmo depois da reprovação do papa Estevão, manteve seu ponto de vista.

Foi decapitado no dia 14 de setembro de 258, em Cartago, reinando Valeriano. O martírio de sangue o redimiu certamente de seu erro.

S. Cipriano compôs as seguintes obras: De ecclesia unitate (c. 251, na qual apoia o papa Cornélio contra Novaciano), De lapsis, De habitu virginum, De mortalitate.

Apregoava a doutrina de que a unidade da Igreja é garantida pela união de todos com o bispo. Ficaram famosas diversas máximas suas:

“Salus extra ecclesiam non est” ou seja, “não há salvação fora da Igreja”;

v  “Quem abandona a sede de Pedro, sobre a qual está fundada a Igreja, como pode afirmar que está na verdadeira Igreja?”;

v  “Não pode ter Deus por Pai quem não tem a Igreja por mãe”.

São Pedro_Saint_Peter_BasilicaSPietro_tramonto_Vatican_City

Ensinava que uma tradição só é válida quando se apóia na “tradição evangélica e apostólica”, ou seja, aquela tradição que provém da “autoridade do Senhor e do Evangelho, das prescrições e das epístolas dos apóstolos”. Afirmava que os recém-nascidos deviam receber o quanto antes o batismo e a eucaristia, e que a missa é a repetição do sacrifício de Jesus na Cruz. Ensinava ainda que a penitência consiste na confissão pública dos pecados e na expiação, e que todos os justos defuntos (inclusive os não-mártires) recebem sua recompensa imediatamente após a morte; segundo ele, o estado intermediário no Hades se aplica somente aos penitentes.

Comodiano, Vitorino de Petau, Arnóbio de Sica e Lactâncio são outros grandes representantes da literatura cristã em latim no século III e no início do século IV.

Os Padres Latinos

Nos primórdios da Igreja, o grego era a sua língua oficial. Quase todo o Novo Testamento, bem como os escritos dos Padres Apostólicos e da maior parte dos Apologistas, foram feitos em grego. Mas aos poucos, o latim foi tomando a dianteira, até por fim tornar-se a língua oficial.

Minúcio Félix

É de Minúcio Félix, um advogado romano, o diálogo apologético em latim denominado Otávio (escrito por volta de 197). Essa obra foi a única escrita em latim no tempo das perseguições.

O genial Tertuliano

Figura de relevo, no mundo latino, é Quintus Septimius Florens Tertullianus, nascido em Cartago por volta do ano 160, filho de um centurião, pagão com excelente formação intelectual, dominando o grego e possuidor de grandes conhecimentos jurídicos e de retórica. Depois de exercer a jurisprudência em Roma, retornou para sua cidade de origem por volta de 195, já como cristão. Mas em torno do ano 207 rompeu com a Igreja e aderiu ao montanismo. Morreu provavelmente depois ano 220.

Conhecendo na perfeição o latim, Tertuliano foi o primeiro a usar o termo Trinitas para designar a Trindade. Expôs também a tese de que o Pai e o Filho eram da mesma substância, tendo-se assim antecipado de um século ao Símbolo de Nicéia.

Suas principais obras foram: Ad nationes, o Apologeticum (aos governadores das províncias do Império – uma apologia que defende os cristãos de acusações políticas tais como o crime de lesa-majestade e a negação dos deuses imperiais; sua argumentação é do ponto de vista jurídico), Adversus Iudaeos, De praescriptione haereticorum, Adversus Marcionem (contra a gnose de Marcião), Adversus Valentinianos (contra a gnose de Valentino), Scorpiace, De carne Christi (contra o docetismo dos gnósticos), Adversus Praxean (trata-se da exposição mais clara, antes de Nicéia, acerca da doutrina da Trindade, contra o patripassiano Práxeas), De baptismo, De anima (obra anti-gnóstica), Ad martyres, De paenitentia, Ad uxorum

Tertuliano fala das duas naturezas e da única pessoa de Jesus Cristo. Ensina que o primado e o poder das chaves foram dados a S. Pedro (fala da morte de S. Pedro e S. Paulo em Roma). Enquanto era católico, ensinava que a Igreja tinha poder de perdoar os pecados, mas uma só vez. Fazendo eco à Didaqué, para ele a Missa é o cumprimento da profecia de Malaquias (Ml 1, 10s), sacrifício verdadeiro oferecido a Deus, e a Eucaristia é o Corpo e o Sangue de Cristo. Também admite um estado de purificação póstumo, no qual todos, menos os mártires, permanecem até o dia do Juízo. As orações dos vivos, segundo ele, podem confortar os que se encontram no Hades. Era milenarista.

Contra os hereges, Tertuliano ensina que apenas a Igreja possui a fé. A ela cabe a reta interpretação das Escrituras, à luz da Tradição. A doutrina conservada nas Igrejas apostólicas estabelece as verdades que devem ser cridas por todos os fiéis. É inútil, segundo ele, discutir com os hereges servindo-se das Escrituras pois eles a distorcem.

Do período montanista temos alguns escritos de caráter ascético, como o De exhortatione castitatis, em que exorta um amigo viúvo a não contrair novas núpcias, De corona (em que condena o exercício das funções militares por cristãos e refere de passagem o costume de se fazer o sinal da cruz), De pudicitia (onde, contrariamente ao que defendia quando católico, nega à Igreja o poder de perdoar pecados).

Sua atitude diante da filosofia pagã é essencialmente negativa. Acredita na possibilidade de uma demonstração racional da existência de Deus e da imortalidade da alma e afirma que a especulação filosófica só é útil enquanto concorda com o Evangelho.

Ao contrário do consenso geral da Tradição cristã, Tertuliano negava a virgindade perpétua de Maria.

São Cipriano de Cartago

Thascius Cecilius Cyprianus nasceu em Cartago (entre 200-210) de uma família rica e pagã. Recebeu o batismo em 246, sendo sagrado, dois ou três anos depois, bispo de sua cidade.

A perseguição de Décio (250) interrompeu suas atividades pastorais, uma vez que foi forçado a se esconder.

Em sua época, muitos apóstatas, os assim chamados lapsi começaram a ser facilmente readmitidos na Igreja, o que deu origem a um cisma. Em 251, S. Cipriano voltou para Cartago e num sínodo excomungou os chefes da dissidência laxista, determinando que os apóstatas passassem por severas penitências antes de reingressarem na comunidade.

A peste que atingiu o Império em 252 provocou novos sofrimentos e perseguições na África.

Nos últimos anos de sua vida, ocupou-se com a questão do batismo dos hereges. Cipriano considerava inválido o batismo ministrado por hereges, e mesmo depois da reprovação do papa Estevão, manteve seu ponto de vista.

Foi decapitado no dia 14 de setembro de 258, em Cartago, reinando Valeriano. O martírio de sangue o redimiu certamente de seu erro.

S. Cipriano compôs as seguintes obras: De ecclesia unitate (c. 251, na qual apoia o papa Cornélio contra Novaciano), De lapsis, De habitu virginum, De mortalitate.

Apregoava a doutrina de que a unidade da Igreja é garantida pela união de todos com o bispo. Ficaram famosas diversas máximas suas:

v “Salus extra ecclesiam non est” ou seja, “não há salvação fora da Igreja”;

v “Quem abandona a sede de Pedro, sobre a qual está fundada a Igreja, como pode afirmar que está na verdadeira Igreja?”;

v “Não pode ter Deus por Pai quem não tem a Igreja por mãe”.

Ensinava que uma tradição só é válida quando se apóia na “tradição evangélica e apostólica”, ou seja, aquela tradição que provém da “autoridade do Senhor e do Evangelho, das prescrições e das epístolas dos apóstolos”. Afirmava que os recém-nascidos deviam receber o quanto antes o batismo e a eucaristia, e que a missa é a repetição do sacrifício de Jesus na Cruz. Ensinava ainda que a pen

Os Padres Latinos

Nos primórdios da Igreja, o grego era a sua língua oficial. Quase todo o Novo Testamento, bem como os escritos dos Padres Apostólicos e da maior parte dos Apologistas, foram feitos em grego. Mas aos poucos, o latim foi tomando a dianteira, até por fim tornar-se a língua oficial.

Minúcio Félix

É de Minúcio Félix, um advogado romano, o diálogo apologético em latim denominado Otávio (escrito por volta de 197). Essa obra foi a única escrita em latim no tempo das perseguições.

O genial Tertuliano

Figura de relevo, no mundo latino, é Quintus Septimius Florens Tertullianus, nascido em Cartago por volta do ano 160, filho de um centurião, pagão com excelente formação intelectual, dominando o grego e possuidor de grandes conhecimentos jurídicos e de retórica. Depois de exercer a jurisprudência em Roma, retornou para sua cidade de origem por volta de 195, já como cristão. Mas em torno do ano 207 rompeu com a Igreja e aderiu ao montanismo. Morreu provavelmente depois ano 220.

Conhecendo na perfeição o latim, Tertuliano foi o primeiro a usar o termo Trinitas para designar a Trindade. Expôs também a tese de que o Pai e o Filho eram da mesma substância, tendo-se assim antecipado de um século ao Símbolo de Nicéia.

Suas principais obras foram: Ad nationes, o Apologeticum (aos governadores das províncias do Império – uma apologia que defende os cristãos de acusações políticas tais como o crime de lesa-majestade e a negação dos deuses imperiais; sua argumentação é do ponto de vista jurídico), Adversus Iudaeos, De praescriptione haereticorum, Adversus Marcionem (contra a gnose de Marcião), Adversus Valentinianos (contra a gnose de Valentino), Scorpiace, De carne Christi (contra o docetismo dos gnósticos), Adversus Praxean (trata-se da exposição mais clara, antes de Nicéia, acerca da doutrina da Trindade, contra o patripassiano Práxeas), De baptismo, De anima (obra anti-gnóstica), Ad martyres, De paenitentia, Ad uxorum

Tertuliano fala das duas naturezas e da única pessoa de Jesus Cristo. Ensina que o primado e o poder das chaves foram dados a S. Pedro (fala da morte de S. Pedro e S. Paulo em Roma). Enquanto era católico, ensinava que a Igreja tinha poder de perdoar os pecados, mas uma só vez. Fazendo eco à Didaqué, para ele a Missa é o cumprimento da profecia de Malaquias (Ml 1, 10s), sacrifício verdadeiro oferecido a Deus, e a Eucaristia é o Corpo e o Sangue de Cristo. Também admite um estado de purificação póstumo, no qual todos, menos os mártires, permanecem até o dia do Juízo. As orações dos vivos, segundo ele, podem confortar os que se encontram no Hades. Era milenarista.

Contra os hereges, Tertuliano ensina que apenas a Igreja possui a fé. A ela cabe a reta interpretação das Escrituras, à luz da Tradição. A doutrina conservada nas Igrejas apostólicas estabelece as verdades que devem ser cridas por todos os fiéis. É inútil, segundo ele, discutir com os hereges servindo-se das Escrituras pois eles a distorcem.

Do período montanista temos alguns escritos de caráter ascético, como o De exhortatione castitatis, em que exorta um amigo viúvo a não contrair novas núpcias, De corona (em que condena o exercício das funções militares por cristãos e refere de passagem o costume de se fazer o sinal da cruz), De pudicitia (onde, contrariamente ao que defendia quando católico, nega à Igreja o poder de perdoar pecados).

Sua atitude diante da filosofia pagã é essencialmente negativa. Acredita na possibilidade de uma demonstração racional da existência de Deus e da imortalidade da alma e afirma que a especulação filosófica só é útil enquanto concorda com o Evangelho.

Ao contrário do consenso geral da Tradição cristã, Tertuliano negava a virgindade perpétua de Maria.

São Cipriano de Cartago

Thascius Cecilius Cyprianus nasceu em Cartago (entre 200-210) de uma família rica e pagã. Recebeu o batismo em 246, sendo sagrado, dois ou três anos depois, bispo de sua cidade.

A perseguição de Décio (250) interrompeu suas atividades pastorais, uma vez que foi forçado a se esconder.

Em sua época, muitos apóstatas, os assim chamados lapsi começaram a ser facilmente readmitidos na Igreja, o que deu origem a um cisma. Em 251, S. Cipriano voltou para Cartago e num sínodo excomungou os chefes da dissidência laxista, determinando que os apóstatas passassem por severas penitências antes de reingressarem na comunidade.

A peste que atingiu o Império em 252 provocou novos sofrimentos e perseguições na África.

Nos últimos anos de sua vida, ocupou-se com a questão do batismo dos hereges. Cipriano considerava inválido o batismo ministrado por hereges, e mesmo depois da reprovação do papa Estevão, manteve seu ponto de vista.

Foi decapitado no dia 14 de setembro de 258, em Cartago, reinando Valeriano. O martírio de sangue o redimiu certamente de seu erro.

S. Cipriano compôs as seguintes obras: De ecclesia unitate (c. 251, na qual apoia o papa Cornélio contra Novaciano), De lapsis, De habitu virginum, De mortalitate.

Apregoava a doutrina de que a unidade da Igreja é garantida pela união de todos com o bispo. Ficaram famosas diversas máximas suas:

“Salus extra ecclesiam non est” ou seja, “não há salvação fora da Igreja”;

v  “Quem abandona a sede de Pedro, sobre a qual está fundada a Igreja, como pode afirmar que está na verdadeira Igreja?”;

v  “Não pode ter Deus por Pai quem não tem a Igreja por mãe”.

Ensinava que uma tradição só é válida quando se apóia na “tradição evangélica e apostólica”, ou seja, aquela tradição que provém da “autoridade do Senhor e do Evangelho, das prescrições e das epístolas dos apóstolos”. Afirmava que os recém-nascidos deviam receber o quanto antes o batismo e a eucaristia, e que a missa é a repetição do sacrifício de Jesus na Cruz. Ensinava ainda que a penitência consiste na confissão pública dos pecados e na expiação, e que todos os justos defuntos (inclusive os não-mártires) recebem sua recompensa imediatamente após a morte; segundo ele, o estado intermediário no Hades se aplica somente aos penitentes.

Comodiano, Vitorino de Petau, Arnóbio de Sica e Lactâncio são outros grandes representantes da literatura cristã em latim no século III e no início do século IV.

itência consiste na confissão pública dos pecados e na expiação, e que todos os justos defuntos (inclusive os não-mártires) recebem sua recompensa imediatamente após a morte; segundo ele, o estado intermediário no Hades se aplica somente aos penitentes.

Comodiano, Vitorino de Petau, Arnóbio de Sica e Lactâncio são outros grandes representantes da literatura cristã em latim no século III e no início do século IV.